Um dia desses eu estava passeando com um amigo por Casa Forte, o meu lugar preferido para me perder e que de tão bonito faz você esquecer que está perdido e achar que está passeando. Pois enquanto passeávamos pelo bairro, meu amigo me apontou uma casa, bem simples, com dois andares, cara de puxadinho, e disse “O restaurante de Marcílio é ai...”. Eu obviamente nunca tinha ouvido falar em Marcílio e só disse “Conte-me mais...” e ele continuou: “O nome do restaurante é Mocó, Marcílio é um cara que cozinha muito bem, abriu esse restaurante ai e não colocou nenhuma placa. É uma proposta diferenciada, para gente conhecida. Eu venho sempre ai com meus pais, é um clima muito bom. A gente tem que vir com a galera tomar uma cerveja ai um dia. Você toca a campainha ai e diz ‘Salve Jorge!’ que eles abrem a porta e o restaurante é lá em cima”. Eu, já acostumado a ir para lugares como Bar da Mira, do Zé Corninho, do Luna, do Cabo, sabia que alguma surpresa me esperava naquele lugar. Combinei com ele de irmos na semana seguinte, no sábado.
Convenci uns camaradas a gastar um pouco mais do que de costume num almocinho de sábado (eu já tinha sido avisado que não era muito barato e que não aceitava cartões), botei a camisa do meu santo, São Jorge, e lá fomos nós. Chegamos lá umas três da tarde e quando eu entrei eu já percebi que todas as ideias que eu fiz do lugar estavam erradas: era um lugar super acolhedor, com ar-condicionado, um tom bastante chique e o teto repleto de caixas de ovos de papelão para abafar a conversa em voz alta das pessoas, além de dar aquele toque rústico. Tudo parecia muito organizado, de bom gosto e como diria o Chapolin, friamente calculado. Comecei a não entender nada. Como um lugar daqueles não tinha uma placa na porta? Não se parecia em nada com nenhum dos outros bares-restaurantes supracitados - que também não tem placa na porta, mas que se mostram lugares bem mais “caseiros” assim que você entra. Na época do marketing viral, era de se admirar um lugar daqueles parecia querer permanecer desconhecido.
Sentamos numa mesa e logo a nossa frente estava a única outra mesa ocupada no recinto, uma família - que parecia ser três gerações de avós, pais e filhas - sentava quase a nossa frente. Começamos a pedir umas entradas e eu já fui sugerindo que a gente comesse apenas petiscos e tomasse muita cerveja. Foi nessa hora que eu peguei o cardápio para ler e percebi que tinha um textinho introdutório explicando de onde surgiu a ideia daquele bar-restaurante e de como ele tinha sido pensado com a ajuda de amigos do Marcílio e para ser um ambiente em que ele gostaria de servir seus amigos e os amigos deles. Tudo parecia perfeito e enquanto eu ia matutando todas as percepções que surgiam ao meu redor duas coisas foram se destacando: as filhas do camarada na mesa da frente eram muito bonitas - apesar de que eu só conseguia vê-las de relance quando uma virava de lado pra falar com a outra, pois estavam de costas para a nossa mesa - e que uma das possibilidades de eu nunca ter ouvido falar nesse lugar era de que a comida poderia ser muito-mais-ou-menos para o preço e por isso ninguém nunca fazia muita propaganda.
Quando eu dei a primeira mordida, arregalei os olhos e falei em voz alta: “AGORA EU ENTENDI TUDO!”, que obviamente foi seguido por uma risadagem do meus amigos e continuamos a comer e beber super felizes enquanto decidiamos se nós iríamos comer mais petiscos ou pedir a famosa carne de sol do lugar, que Pedro queria comer de todo jeito, a contragosto da minha pessoa, que queria experimentar o cordeiro ao molho de vinho.
Nesse ínterim chega o nosso velho amigo Romero, tio de outro amigo nosso que não estava lá, e que nós tínhamos encontrado mais cedo e combinado que ele aparecesse, coisa que não dava pra saber ao certo se ia acontecer, visto que o cara é a maior figura do mundo, super engraçado e com uma voz rouca que dá vontade de rir até ele falando coisa séria (não que eu já tenha visto ele falando alguma coisa séria). Romero, diferente de mim, obviamente já conhecia Marcílio de longas datas. - “Putz, Romero, tu conhece todo mundo mesmo né?” - “É que eu já vivi o dobro da tua idade, né abestalhado” - “Ô Romero, responde ai, tu tem essa voz assim desde quando mais ou menos?” - “DESDE QUE EU NASCI!” e começa a imitar um bebê falando com a mãe com a voz dele, para mais risadagem geral.
Marcílio já chegou na nossa mesa dizendo: “Um homem da sua idade andando com um bocado de rapaz mais novo.... nem precisa explicar viu. Se disser que algum é seu sobrinho complica mais, melhor ficar calado...”. A gente riu que só e eu só consegui completar essa piada com “O passivo é o fortão ai oh!” deixando meu amigo meio encabulado lá - “Ai tu me quebra”, disse ele.
Depois de muita complicação de pede mais petisco ou pede um prato de almoço resolvemos pedir a carne de sol. Enquanto a gente esperava Marcílio contava umas histórias engraçadíssimas que fazia todo mundo rir muito e terminou quebrando um pouco o gelo entre as mesas. Lá pras tantas ele trouxe um violão e pediu pra um dos meus amigos tocar, mas ninguém queria pegar essa responsabilidade pra si. Quando o pessoal da outra mesa começou a pedir também pra alguém tocar alguma coisa eu comecei a insistir muito pra Pedro tocar alguma coisa: “Vai Pedroca, não me decepciona, toca alguma coisa que faça essas meninas virarem pra cá pra nossa mesa, só pro ambiente ficar mais bonito, toca vai, toca...”. E Pedro, sem me desapontar, pegou o violão e mandou um “O Mundo é um moinho”, de Cartola, fazendo imediatamente as pessoas da outra mesa se virarem em nossa direção. Eu quase dei um beijo nele ali na hora mesmo de tão feliz que eu fiquei. Teve uma hora que o senhor mais velho da outra mesa aproveitou um momento de silêncio, virou pra sua esposa e disse: “Tá vendo, meu amor, quando você me pergunta o que é que eu tanto faço nos restaurantes até tarde: é isso aqui!” hahahaha foi uma tirada perfeita no momento perfeito, a esposa dele estava com cara de quem estava adorando tudo e agora ela não podia mais reclamar (até parece né, mas que eu achei genial o momento que ele usou pra fazer o comentário, isso eu achei).
Tocaram mais umas músicas e chegou a Carne de Sol, que estava perfeita. Ainda comemos uma sobremesa que era um waffle delicioso. Ficamos por lá bebendo mais um pouco, mas já eram quase seis da noite e alguns tinham que partir para novos compromissos, para tristeza geral da nação, que parecia ignorar que já estava escurecendo e a gente ainda estava no almoço.
Só posso dizer que eu sai de lá com três coisas na cabeça: a certeza que vou voltar, com a vontade de dizer aos quatro cantos do mundo que me apresentaram um lugar maravilhoso e com a dúvida se eu devia colocar o endereço do Mocó aqui ou não. Decidi não colocar, porque afinal, apesar desse blog não ser super popular, se ficarem distribuindo o endereço do lugar assim e chegar ao ponto de ter uma fila na frente (de modo que os amigos de Marcílio não consigam mais ir almoçar lá) vai definhar o propósito da coisa completamente. Então, se você leu até aqui, coloque Mocó Bar e Restaurante no google que nem todo mundo pensa feito eu e tem o endereço do Mocó em altos cantos da internet.